A Bíblia diz que o Pai é amoroso. O Novo Testamento afirma o mesmo sobre Jesus. Mas será que eles são realmente amorosos se, ao mesmo tempo, mandam as pessoas para o inferno? Afinal de contas, Jesus ensina mais sobre o inferno do qualquer outra pessoa na Bíblia toda. Isso não contradiz seu caráter supostamente gentil e compassivo?
Ao fazer essa pergunta a Carson, citei as palavras contudentes do agnóstico Charles Templeton: "Como é que um pai celestial amoroso é capaz de criar um inferno sem fim e, ao longo dos séculos, enviar milhões de pessoas para lá porque não aceitam, não podem aceitar ou recusam-se a aceitar certas crenças religiosas?" (Templeton, Farewell to God, p. 230.).
Essa pergunta, que eu formulei de modo a causar impacto não deixou Carson irado.
- Em primeiro lugar - disse ele - não creio que Deus simplesmente joga as pessoas no inferno porque elas se recusam a aceitar algumas crenças específicas.
Carson fez uma pausa, depois retomou o assunto de forma mais detalhada, discutindo um tópico que muitas pessoas hoje consideram um anacronismo: o pecado.
- Imagine Deus no início da criação com um homem e uma mulher feitos à sua imagem - disse Carson. - Eles se lavantam pela manhã e pensam em Deus. Eles o amam de verdade. Tem prazer em satisfazê-lo, e para eles não há prazer maior. Seu relacionamento com Deus é perfeito, e ambos se dão muito bem. Depois, com a entrada do pecado e da rebelião no mundo, o casal, que era a imagem de Deus, começou a achar que era o centro do universo. Não litaralmente, mas era o que achavam. E é assim que nós pensamos também. Tudo o que chamamos "patologias sociais", a guerra, o estupro, a amargura, o sentimento de inveja que alimentamos dentro de nós, os ciúmes ocultos, o orgulho, os complexos de inferioridade, estão todos vinculados, antes de tudo, ao fato de que nosso relacionamento com Deus não é como deveria ser. Conseqüentemente, as pessoas se sentem feridas. Da perspectiva divina isso é terrivelmente repugnante. O que Deus devia fazer a respeito? Se ele disse: "Bem, não me importo," estará dizendo que não se importa com o mal. É mais ou menos como se disséssemos: "Tudo bem, já ouvi falar do holocausto, mas e daí?". Você não ficaria chocado só de pensar na possibilidade de Deus achar que isso não tem nenhuma importância moral? Mas, em princípio, se ele é o tipo de Deus que atribui importância moral a esse tipo de coisa, tem necessariamente de se importar com todos os que, criados à sua imagem, desafiam-no com o punho em riste e cantam, como Frank Sinatra: "I did it my way" ("agi como quis"). Essa é a verdadeira natureza do pecado. Dito isso, o inferno não é um lugar para onde são mandadas as pessoas simplesmente porque foram estúpidas o bastante para não acreditar no que deveriam crer. Eles foram para lá, principalmente porque desafiaram seu criados e quiseram ser o centro do universo. O inferno não está cheio de pessoas agora arrependidas que Deus não deixa sair porque sua bondade não chega a tanto. Ele está cheio de pessoas que, por toda a eternidade sempre quiseram ser o centro do universo e insistem em desafiar a Deus. O que Deus deveria fazer? Se disser que não se importa com isso, não será mais um Deus digno de admiração. Ou é um ser amoral ou um monstro. Se agisse de outro modo diante de uma insubordinação tão evidente, ele não seria o Deus que é, seria menos.
- Entendo - interrompi -, mas o que mais parece incomodar as pessoas é o fato de que Deus vai atormentar essas pessoas por toda a eternidade. Isso não leh parece cruel?
- Em primeiro lugar - disse Carson -, a Bíblia diz que existem diferentes graus de castigo, portanto, não creio que o grau de intensidade será o mesmo para todos. Em segundo lugar, se Deus retirasse suas mãos desse mundo decaído, de modo que não houvesse mais nenhuma restrição para a impiedade humana estaríamos vivendo no inferno. Assim, se você permitir que uma multidão de pecadores viva em um lugar confinado onde não possam prejudicar ninguém, exceto a si mesmo, não seria isso o inferno? Em certo sentido, é o que acontece: eles estão prejudicando a si mesmos. É isso o que querem, porque não se arrependeram.
Achei que Carson tinha concluído sua resposta, porque percebi que hesitou um pouco. Todavia, ele tinha ainda uma observação crucial por fazer.
- Uma das coisas na qual a Bíblia insiste é que, no fim, não apenas se fará justiça, mas será possível ver a justiça sendo feita, de modo que toda boca se cale.
Suas últimas palavras me chamaram a atenção.
- Em outras palavras - eu disse -, quando chegar o dia do julgamento final, ninguém vai poder se queixar dizendo que Deus não lhe deu um tratamento justo. Todos vão reconhecer a justiça genuína pela forma como Deus irá julgá-los, e também ao mundo.
- Correto - afirmou Carson resoluto. - nem sempre se faz justiça no mundo: é o que vemos diariamente. No dia do juízo final, porém, todos poderão vê-la. Ninguém vai poder se queixar dizendo: "isto não é justo."
Extraído do livro EM DEFESA DE CRISTO, do autor: Lee Strobel. Páginas: 219-221.